BEM-AVENTURADOS OS MANSOS

Eis a promessa que o Senhor Jesus faz a cada um de nós: “Bem-aventurados os mansos, porque possuirão a Terra!” (Mt 5,5).

Na terceira Bem-aventurança, nosso Senhor Jesus Cristo nos ensina que são “Bem-aventurados os mansos, porque possuirão a Terra!” (Mt 5,5). Este é tema do terceiro artigo da série que a Fraternidade Discípulos da Mãe de Deus produz sobre as Bem-aventuranças. A partir desta passagem, somos convidados a meditar sobre o significado bíblico, teológico e magisterial desta mansidão e da promessa de Deus a ela condicionada: “possuirão a Terra!”.

Eis a promessa que o Senhor Jesus faz a cada um de nós: “Bem-aventurados os mansos, porque possuirão a Terra!” (Mt 5,5).Milagre de Jesus nas bodas de Caná (cf. Jo 2, 1-12).

Quando falamos em possuir a Terra… Todo mundo quer! Quando se coloca a condição de ter que ser “manso” para possuir tal “terra”, as pessoas resfriam na conquista da Bem-aventurança. Por que será? É simples! Não sabemos ainda o significado de ser “manso”.

O que a mansidão não é?

A mansidão para muitos é associada a timidez, a fraqueza e a falsidade! Jesus era pacífico e se considerava manso. Ele deu seu testemunho: “Eu sou manso e humilde de coração” (Mt 11, 29). Nosso Deus, por ser manso, não era tolo, nem volúvel e nem covarde.

Você já ouviu expressão de fazer alguém de tolo, de “gato-sapato”? Significa maltratar, humilhar uma pessoa numa brincadeira infantil onde se leva “patadas”, sem que este que “apanha” exalte as suas convicções. Diante disso, termina-se cedendo às pressões e deixando seus posicionamentos. Esquecer seus ideais, não significa mansidão.

Mansidão não quer dizer que uma pessoa seja acomodada, ou que não tenha firmeza e persuasão, que seja volúvel, ou seja, que sua opinião mude com facilidade ou a todo instante. Tampouco, mansidão não é covardia, não é ausência de coragem e falta de ousadia.

O prepotente e o arrogante abusam do poder e da autoridade. Nunca ficam por “baixo” e na necessidade utilizam a violência para provar aos outros o seu poder. Estes consideram a mansidão uma tolice, uma fraqueza.

Você é manso?

Tente imaginar qual seria a sua reação se você fosse incomodado e agredido por alguém. Imagine que alguém diga: você é feio! e isso… e mais aquilo… Você ficaria inflamado? Quando contrariado, você reage com zanga e ira?

Perante de uma injúria ou uma injustiça, você grita em autodefesa, acusa os outros e guarda rancor?

Fica com raiva, quando não se percebe perfeito, ou quando não é nem o melhor e nem o maior?

Nas ocasiões que lhe faltam com a caridade ou respeito, busca vingança?

Para com os pobres, enfermos, crianças e viúvas você age com arrogância e aspereza? E com sua família?

É interessante identificar se estas “raivinhas” são impulsos momentâneos ou se já são sentimentos marcantes.

Deus nos quer “mansos”, e é primordial compreender que o grande desvio para que não alcancemos a mansidão é a “ira”. Esta, é um grande obstáculo ao progresso espiritual. Ela acomete a pessoa que se incomoda facilmente com as coisas e que se sente amargurada. É entendida como um conjunto de fortes emoções e, muitas vezes, é traduzida por impaciência e irritação.

Não é sem razão que nosso Mestre e Senhor nos alertou a respeito do perigo de irar-nos contra os nossos irmãos: “Mas eu vos digo: todo aquele que se irar contra seu irmão será castigado pelos juízes. Aquele que disser a seu irmão: Raca, será castigado pelo Grande Conselho. Aquele que lhe disser: Louco, será condenado ao fogo da geena” (Mt 5, 22).

Segundo Santo Agostinho: “O ódio nada mais é que uma raiva perseverante”. Por isso, Santo Tomás diz que “A ira é súbita, mas o ódio é duradouro”.

Meus irmãos, é diante das adversidades que descobrimos quem verdadeiramente somos. Quem somos nós diante de Deus e dos homens? Você responderia a uma ofensa com ira ou com mansidão? Quando você recebe uma abordagem que lhe é desfavorável, você a suporta e reage com tranquilidade, moderação, disciplina e paz no coração?

O que é a mansidão?

Uma pessoa que expressa em seu comportamento a mansidão, quer dizer que ela tem personalidade. Mas, em nome da paz, tem a sabedoria de colocar os seus argumentos na hora certa e da melhor forma. O “manso” tem suas vontades e convicções, sim! Contudo, ele tem a sensibilidade para não colocar seus projetos a perder antes do tempo favorável.

Pense um pouco! A sua forma de ser é marcada pela soberba e pelo orgulho? Sua forma de expressão é a prepotência e a arrogância? Preste atenção: se a resposta for sim, você terá muita dificuldade na vivência da mansidão. Sem Deus e o auxílio da Virgem Maria, ser manso será impossível! A “mansidão” não se compra num shopping, não se troca na feira, não se conquista numa luta ou briga! Por mais que se tenha recebido uma “boa educação”, uma pessoa não está livre da ignorância agressiva.

Só Deus! A “mansidão” é prêmio, é graça e favor Divino! Na Carta aos Coríntios, São Paulo não diz que a mansidão é um dom ou carisma. A mansidão também não é dom do Espirito Santo, como é a sabedoria, a inteligência, o conselho, a fortaleza, a ciência, a piedade e o temor de Deus1. O Catecismo da Igreja Católica nos diz que a mansidão é fruto do Espírito Santo2, conforme nos ensina as Sagradas Escrituras: o fruto do Espírito Santo é a caridade, a alegria, a paz, a paciência, a longanimidade, a bondade, a benignidade, a mansidão, a fidelidade, a modéstia, a continência e a castidade (cf. Gl 5, 22-23).

Entendamos! Quando um batizado, “filho de Deus” pela força do Espirito Santo, se empenha para viver uma virtude a exemplo e a imitação da Virgem Santíssima, ele conquista um “estado de alma”. Ser obediente, e ou mortificado, e ou caridoso, e ou paciente… Por exemplo: sendo humilde, ele será herdeiro de Deus, e terá como um dos frutos a mansidão.

O autodomínio é a mansidão, que independente dos fatos. O manso não perde a calma, a gentileza para com o outro e a simplicidade na resposta. O manso é aquele que permanece equilibrado e confiante no Senhor; que tudo responderá de modo que não desagrade Deus e nem aos irmãos, sabendo suportar os dissabores da vida com humildade.

Mansidão se confunde com obediência e com respeito. Mas, vai além de só silenciar quando a agressão vem de um superior. Para ser provado na mansidão, imagine que um “pobre, um subalterno” agisse com você com aspereza. Ainda assim, você continuaria com um sorriso nos lábios? Você dispensaria a oportunidade de revidar, ou o atacaria com todas as suas “garras”?

Entendamos que a mansidão é uma coragem sem violência, uma força sem dureza, um amor sem cólera. A mansidão é antes de tudo uma paz desejada. É o contrário da guerra, da crueldade, da brutalidade, da agressividade, da violência… Mesmo havendo angústia e sofrimento, pode haver mansidão.

A mansidão e a Virgem Maria

Mesmo nas situações de aflições, Maria Santíssima nos ensina anão perder a mansidão: “E deu à luz seu filho primogênito, e, envolvendo-o em faixas, reclinou-o num presépio; porque não havia lugar para eles na hospedaria” (Lc 2, 7). Nossa Senhora não agia com amargura ou cólera. A Sagrada Família como um todo sempre permaneceu na mansidão. Nela não houve grito, murmuração, nem mesmo quando se viram naquele estábulo. Depois, tiveram que permanecer na obediência: “Levanta-te, toma o menino e sua mãe e foge para o Egito; fica lá até que eu te avise, porque Herodes vai procurar o menino para o matar” (Mt 2, 13). A confiança em Deus de Maria e José era inabalável.

Prepotente é a pessoa que busca seus próprios interesses, que abusa do seu poder e de sua autoridade. A Virgem Maria nunca foi opressora, mas, na mansidão, Advogada. A mansidão não gera egoísmo, e nem comodismo, mas senso de justiça e amor ao próximo. A confiança da Virgem Maria estava no poder de Deus. Ela tinha e tem total dependência Dele. Isso se exprime bem no Magnificat: “porque realizou em mim maravilhas aquele que é poderoso e cujo nome é Santo” ( Lc 1, 49).

Nossa Senhora não exerceu sua função materna apenas em relação a Jesus, mas cuidou de cada um dos discípulos de seu Filho, com muita ternura e muito dengo! Ela sabia que sua mansidão de mulher e seus incentivos eram importantes para que aqueles homens continuassem perseverando ao lado de Cristo, seu Filho, e principalmente depois da morte Dele. Ainda hoje, a Santíssima Virgem continua a cuidar de nós com seu amor materno e a nos ensinar a mansidão.

Era característico do Apóstolo Pedro passar de um extremo ao outro. Seus defeitos eram visíveis a todos: desinibido, interesseiro, egoísta e falante. Falava sem pensar, e essa espécie de descuido também o trazia complicações, tendo sido o motivo para o Mestre, muitas vezes, ter chamado sua atenção (cf. Mc 8, 33; Jo 21, 15-17; Mt 26, 34; Jo 18, 10-11). Ele, além de tudo, ainda negou Jesus três vezes (cf. Mt 26, 69-75). Mas, imagine se a Mãe de Nosso Senhor tivesse agido como ele, com impaciência, com irritação e cólera. Se ela tivesse buscado a vingança, teria colocado tudo em ruína.

A Santíssima Virgem transpareceu a Pedro o caráter da mansidão. Ela foi o Evangelho vivo, para aquele que conduziria a nossa Igreja. Ela, com sua tranquilidade, não foi negligente, mas com sua brandura ensinou a São Pedro que Deus é Misericórdia! E, ter compaixão do próximo, era algo que ele precisava praticar para que além de conquistar as pessoas, alcançasse a Terra prometida!

Pedro provavelmente fez memória da ligação e interação de Jesus com a sua Mãe Santíssima. Através das reações da Virgem Maria, Pedro compreendia que ela conquistava os favores de seu Filho, Deus feito homem, não pela força e violência, mas certamente pela mansidão, como ocorreu nas Bodas de Caná, quando disse: “Eles já não têm vinho” (Jo 2, 3).

Com todos, inclusive com Jesus, a Virgem Maria agia com ternura, carinho e afeto. Além de ter conseguido mais talhas de vinho, alcançou “o primeiro milagre de Jesus; realizou-o em Caná da Galileia” (Jo 2, 11). E, consequentemente proporcionou que os discípulos colocassem crença no Cristo, que operava prodígios e milagres.

Com certeza, nos momentos oportunos e reservadamente, a Mãe do Filho de Deus fazia as correções fraternas, mas evitava as repreensões públicas. Lembre-se de quando ela reencontrou seu Filho no Templo! (cf. Lc 2, 41-52).

A Mãe de Deus jamais foi motivo de escândalo, ou pedra de tropeço. Não encontramos passagens bíblicas de afrontas e discussões envolvendo a Virgem.

Quem sabe, foi pela mansidão dos Sagrados Corações de Jesus e Maria, que aquele centurião reconhece que Jesus era um justo. Aos pés da Santa Cruz, a Virgem Maria e ao seu lado o Discípulo amado, se preenchem ainda mais da mansidão quando escutam o Redentor do mundo proferir em alta voz: “Pai, perdoai-lhes, porque não sabem o que fazem!” (Lc 23, 34).

Após a morte de Jesus, foi a Santíssima Virgem, abrasada pelo Espirito Santo, que ficou firmando e formando os Apóstolos. Dentre tantos ensinamentos, a Virgem Dolorosa nos ensinou, aos pés da cruz no Calvário (cf. Jo 19, 25), que a Igreja deve ser sustentada pela mansidão, mesmo em meio a perseguições, agonias e injustiças.

São Luís Maria Grignion de Montfort considera a mansidão da Virgem Maria, quando diz no seu valoroso livro “Tratado da Verdadeira Devoção a Santíssima Virgem”:

A Santíssima Virgem, que é uma Mãe toda doçura e misericórdia, nunca se deixa vencer em amor e liberdade. Por isso, quando vê que alguém se lhe dá totalmente para a honrar e servir, despojando-se do que tem de mais querido para a amar, dá-se também, inteiramente e duma maneira inefável, a quem tudo lhe deu. Ela submerge-o no abismo das suas graças, ela adorna-o com os seus méritos, ela lhe dá o apoio do seu poder, ela o ilumina com a sua luz, ela o abrasa no seu amor, ela comunica-lhe as suas virtudes: sua humildade, sua fé, sua pureza, sua doçura. Ela se torna a sua garantia, seu suplemento e seu tudo perante Jesus3.

A nossa herança: um novo céu e uma nova terra

“Bem-aventurados os mansos, porque possuirão a Terra!” Opa! Tem herança… Literalmente, de que Terra está se falando? Quantos alqueires? Tem poluição? Os rios são limpos? Esta Terra é serrana, praiana, é no sertão? Deserto ou Paraíso? Será Jerusalém?

Lógico que, do ponto de vista teológico desta promessa, não se trata de algo terreno. “Segundo sua promessa, esperamos novos céus e uma nova terra, nos quais habitará a justiça.” (2 Pd 3, 13). Esta promessa já estava presente no livro dos Salmos: “Quanto aos mansos, possuirão a terra, e nela gozarão de imensa paz” (Sl 37, 11).

Estas terras serão entregues para aqueles que buscarem a misericórdia de Deus, aos que aprenderem a virtude da humildade, aos que se arrependerem e assumirem Jesus como o Senhor de suas vidas. Esta é a promessa do Senhor que também nos foi transmitida pelo profeta Isaías: “Aquele, porém, que contar comigo herdará a terra, e possuirá meu monte santo” ( Is 57,13).

A Terra prometida será uma Terra que ainda não conhecemos. Nesta, não existirá nem pecado nem pecadores. A Bem-aventurança é uma promessa para o futuro: “herdarão”. No entanto, o Reino dos Céus já é construído aqui na Terra, que é a própria presença do Senhor no meio de nós: “o Reino de Deus já está no meio de vós” (Lc 17, 21). Para que essa realidade do Reino aconteça, Jesus nos ensinou o que fazer: “Tomai meu jugo sobre vós e recebei minha doutrina, porque eu sou manso e humilde de coração e achareis o repouso para as vossas almas” (Mt 11, 29). Somente após da segunda vinda do Senhor, “no fim dos tempos, o Reino de Deus chegará à sua plenitude. Depois do Juízo final, os justos reinarão para sempre com Cristo, glorificados em corpo e alma, e o próprio universo será renovado”4.

Esta Terra não é um lugar qualquer, pois é o próprio Jesus que o prepara para nós: “Na casa de meu Pai há muitas moradas. Não fora assim, e eu vos teria dito; pois vou preparar-vos um lugar” (Jo 14, 1). O livro do Apocalipse de São João nos dá uma visão extraordinária do Reino dos Céus, do novo céu e da nova Terra, que é a Jerusalém Celeste:

Vi, então, um novo céu e uma nova terra, pois o primeiro céu e a primeira terra desapareceram e o mar já não existia. Eu vi descer do céu, de junto de Deus, a Cidade Santa, a nova Jerusalém, como uma esposa ornada para o esposo. Ao mesmo tempo, ouvi do trono uma grande voz que dizia: Eis aqui o tabernáculo de Deus com os homens. Habitará com eles e serão o seu povo, e Deus mesmo estará com eles. Enxugará toda lágrima de seus olhos e já não haverá morte, nem luto, nem grito, nem dor, porque passou a primeira condição (Ap 21, 1-4).

Bem-aventurados os mansos, porque herdarão o Reino dos Céus!

 

Links relacionados:

TODO DE MARIA. Meditações sobre as Bem-aventuranças.

TODO DE MARIA. Bem-aventurados os pobres de coração.

TODO DE MARIA. Bem-aventurados os que choram.

TODO DE MARIA. Mara Carvalho e a Discípulos da Mãe de Deus.

 

Referências e notas:

1 CONCÍLIO VATICANO II. Catecismo da Igreja Católica, §1831.

2 Idem, §1832.

3 SÃO LUÍS MARIA GRIGNION DE MONTFORT. Tratado da Verdadeira Devoção a Santíssima Virgem, 144.

4 CONCÍLIO VATICANO II. Catecismo da Igreja Católica, §1042.

Fonte: Todo de Maria

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